Teremos uma vacina segura contra a Covid-19 em pouco tempo? A proteção será duradoura? Investigamos documentos da OMS para abordar questões palpitantes
Por Nathalie Ayres 7 nov 2020, 09h43
Para te dar uma mãozinha nesse momento, chafurdamos documentos da Organização Mundial da Saúde (OMS) que discutem as principais perguntas sobre o tema. Confira:
1. Quando teremos uma vacina aprovada?
Não dá para cravar uma data para a aprovação e distribuição de uma vacina segura e eficaz contra o coronavírus. Há sempre a possibilidade de interrupções momentâneas de estudos e de que as candidatas em testes mais avançados não funcionem. Ainda assim, a previsão da OMS é que a liberação de um imunizante para a Covid-19 ocorra entre o começo e meio de 2021. Isso depende dos seguintes pontos:
- Provas de segurança e eficácia em estudos clínicos confiáveis de larga escala. Algumas potenciais vacinas estão nas fases finais dessa etapa: a de Oxford (AstraZeneca), a da Sinovac Biotech, a da Pfizer e a da Moderna. O imunizante da Janssen entrou em uma pausa nos testes em outubro, o que é normal em testes dessa magnitude.
- Depois de prontos, é preciso que essas pesquisas passem por revisões de profissionais independentes (sem elo com as empresas envolvidas) e pela avaliação de órgãos regulatórios de cada país.
- Aí a OMS analisa os resultados dos testes clínicos e o que já sabemos sobre a Covid-19 para fazer uma indicação de como cada vacina pode ser usada para controlar a pandemia.
- Essas recomendações são levadas em conta pelas autoridades de cada país.
2. Quão rápido uma vacina pode parar a pandemia?
De acordo com a OMS, o impacto na contenção do coronavírus dependerá de alguns fatores. Eles incluem a eficácia do imunizante, a agilidade com que será aprovado, fabricado e distribuído e a quantidade de pessoas que receberão as doses.
Especula-se que as vacinas contra a Covid-19 não serão 100% eficientes (assim como as para muitas outras doenças). Mesmo assim, elas devem ter um efeito importante no combate à pandemia.
A Food and Drug Administration (FDA), agência que regula medicamentos nos Estados Unidos, estipulou que só aprovará produtos com eficácia superior a 50%, algo semelhante à OMS. Aqui no Brasil, a Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária) estabeleceu um limite mínimo de 70%, mas admitiu que 50% também seria suficiente.
E mais: um artigo recente publicado no Journal of American Medical Association (JAMA) argumenta que a eficácia das injeções talvez varie em diferentes grupos. Idosos podem produzir menos anticorpos do que os mais jovens, por exemplo. É importante que as pesquisas observem essas diferenças, já que elas impactariam no controle da pandemia.
Outro ponto importante: mesmo com a vacinação, pode ser necessário manter por um tempo medidas como uso de máscaras e distanciamento social. Principalmente enquanto houver pouca vacina para muita gente.
3. Que tipos de vacinas estão sendo desenvolvidas?
- Vacinas com o vírus inativo ou enfraquecido: elas modificam o Sars-CoV-2 para que ele não cause a doença, mas ainda assim gere uma resposta imunológica. Entre os imunizantes em fase 3 de testes, apenas os das empresas chinesas Sinovac e Sinopharm utilizam esse modelo.
- Vacinas à base de proteínas: elas selecionam pedaços do coronavírus que são inofensivos ou cápsulas de proteínas que imitam o vírus, gerando uma resposta imunológica segura no corpo. É o caso da candidata da Novavax.
- Vacinas de vetor viral: um pedaço do material genético do Sars-CoV-2 é acoplado a outro vírus incapaz de causar doenças. Ao entrar no corpo, esse agente instiga células do próprio corpo a produzirem outras substâncias inofensivas do novo coronavírus, mas que são reconhecidas pelo sistema imunológico. Pronto: ele começa a fabricar anticorpos e se proteger contra a Covid-19 de verdade. É a tecnologia presente nas vacinas de Oxford, da CanSino, do Instituto Gamaleya (Rússia) e da Janssen.
- Vacinas com RNA viral: é produzido, em laboratório, um pedaço inofensivo do material genético do Sars-CoV-2 que, uma vez inserido no seu organismo, dispara a resposta imunológica. Entre as concorrentes em fase 3, as desenvolvidas pela Pfizer e pela Moderna empregam esse método.
4. Como ter certeza de que uma vacina é segura?
Respeitar as etapas necessárias dos estudos e as revisões posteriores garantem a segurança. Por isso é importante aguardar os resultados consolidados dos experimentos. As etapas principais das pesquisas cínicas são:
- Fase 1: testes com pequenos grupos de pessoas (dezenas ou centenas, no máximo) para entender se a vacina causa ou não efeitos colaterais e para verificar dosagens mais adequadas.
- Fase 2: centenas (ou até milhares) de voluntários são examinados. Além de possíveis efeitos colaterais, começa a ser medida o efeito da vacina no sistema imunológico.
- Fase 3: o imunizante é aplicado em milhares de pessoas em diferentes locais para verificar se, na prática, ele evita a Covid-19 e não provoca reações adversas inaceitáveis.
Se tudo isso der certo, os órgãos reguladores aprovam a distribuição da vacina. Mas as investigações não param aí. Há ainda a fase 4, em que estudos de vigilância seguem monitorando a população para, entre outras coisas, verificar eventuais reações adversas mais raras.
5. Vacinas para outras infecções podem proteger contra o coronavírus?
Ainda não há evidências sólidas de que injeções para outros vírus e bactérias exerçam alguma influência no curso da Covid-19. Cientistas brasileiros estão estudando a ação da vacina BCG nesse cenário, mas não há resultados finais.
6. As doses vão conferir proteção de longo prazo?
É cedo para cravar qualquer coisa nesse sentido. As informações de momento mostram que a maioria das pessoas que se recupera da Covid-19 apresenta uma resposta imunológica que a protege por pelo menos um bom número de meses (embora existam casos confirmados de reinfecção). Só o avanço da pandemia e da ciência dirá ao certo por quanto tempo o contato com o vírus ou com uma vacina levanta as defesas do organismo.
7. Dá para acelerar o desenvolvimento de vacinas sem comprometer a segurança?
Normalmente, os testes clínicos demoram anos, por causa das diferentes etapas a serem cumpridas. Entretanto, em uma situação emergencial, alguns desses passos podem ser feitos paralelamente para agilizar as respostas. O dinheiro investido e a magnitude de pessoas infectadas facilita essa dinâmica.
A OMS lidera um esforço global chamado Acelerador de Acesso às Ferramentas Covid-19 (ACT, na sigla em inglês). Como parte dessa iniciativa, recursos de diversos países são somados para a produção de um imunizante seguro e eficaz. É uma forma de compartilhar riscos financeiros e garantir orçamento para uma aquisição conjunta ao redor do globo, capaz de oferecer as doses de forma mais equitativa.
8. Quem deve receber a vacina do coronavírus primeiro?
Idealmente, toda a população deveria ser vacinada. Mas as limitações de produção e distribuição em um primeiro momento exigirão que as autoridades estabeleçam grupos prioritários. A OMS criou documentos para guiar a decisão de quem deve receber as picadas primeiro. Por exemplo: na diretriz “Roteiro para a Priorização de Grupos Populacionais para Vacinas contra Covid-19”, a entidade sugere que grupos como profissionais de saúde com alto risco de infecção, idosos e certos grupo de risco, como portadores de doenças cardíacas e diabetes, sejam colocados na frente da fila.
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