PEC do fim do foro privilegiado

Compartilhar:
Facebook
Twitter
LinkedIn
WhatsApp
Telegram
[views count="1" print= "0"]
[tta_listen_btn listen_text="Ouvir" pause_text="Pause" resume_text="Retomar" replay_text="Ouvir" start_text="Iniciar" stop_text="Parar"]

 

Com o foro, o STF concentra nas próprias mãos o destino de parlamentares

 

Por Carlos Arouck

Oito anos depois de aprovada no Senado, a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 333/2017 que extingue o foro privilegiado para crimes comuns, voltou ao radar legislativo. Não por acaso o seu reaparecimento em 2025 coincide com um momento de choque institucional, no qual decisões do Supremo Tribunal Federal (STF) têm provocado reposicionamentos dentro do Congresso.

A trajetória dessa PEC é marcada por idas e vindas. Em 2013, Alvaro Dias apresentou a proposta para restringir o foro privilegiado, permitindo que apenas os presidentes dos Três Poderes mantivessem esse direito. Quatro anos depois, em 31 de maio de 2017, o Senado aprovou o texto por unanimidade. Desde então, a proposta ficou engavetada na Câmara, travada pela falta de consenso e por manobras discretas para evitar sua votação.

O cenário mudou em fevereiro de 2025, quando a prisão domiciliar de Jair Bolsonaro reacendeu o debate. A oposição, especialmente o PL e parte do Centrão incluindo PP, União Brasil e PSD, viu na PEC uma bandeira política de alto valor. Mesmo sem efeito retroativo, a medida passou a ser tratada como recado ao STF e como instrumento de mobilização de base. Entre março e agosto, líderes partidários iniciaram uma série de reuniões fechadas para garantir os 308 votos necessários à aprovação em dois turnos na Câmara.

Em público, o argumento central é o de que a PEC promove “igualdade perante a lei” e assegura que autoridades sejam julgadas como qualquer cidadão, com direito ao duplo grau de jurisdição. Nos bastidores, porém, os partidos querem reduzir a concentração de julgamentos no STF e, ao mesmo tempo, abrir alternativas jurídicas para aliados sob investigação.

O retorno da proposta não se deu em sessões abertas, mas em articulações discretas. Deputados e senadores alinhados ao Centrão e ao PL têm se encontrado em gabinetes e jantares políticos para articular a votação. A estratégia é evitar exposição precoce, impedindo que adversários proponham emendas capazes de inviabilizar o texto. Paralelamente, aliados da PEC vêm buscando o apoio de governadores e líderes partidários estaduais para orientar suas bancadas a votar a favor.

A oposição à PEC também atua longe dos holofotes. Integrantes do governo Lula evitam confronto direto, mas trabalham para esfriar o ímpeto da votação. O discurso oficial aponta “vícios de inconstitucionalidade” e risco de sobrecarga na primeira instância. Na prática, a preocupação é perder um instrumento de influência política que o foro privilegiado ainda representa em casos estratégicos.

No STF, ministros alertam, em conversas privadas, que o fim abrupto do foro pode gerar insegurança processual, transferir investigações complexas para juízes com pouca estrutura e abrir brechas para recursos que anulem processos.

Um ponto sensível é a ausência de retroatividade: casos já no STF continuarão tramitando ali, mas processos contra autoridades eleitas a partir de 2026 passariam a começar na primeira instância, onde o ritmo e o contexto político são diferentes.

A votação da PEC será mais que um debate sobre privilégios processuais: é uma disputa direta por influência entre Congresso e STF e um teste para medir até onde o Legislativo está disposto a retomar protagonismo no desenho institucional brasileiro.

Se aprovada, a PEC reduzirá o número de autoridades que chegam direto aos tribunais superiores, redistribuindo processos para instâncias inferiores. Isso pode significar um avanço simbólico contra privilégios, mas também alterar o equilíbrio entre os Poderes, mexendo numa engrenagem sensível da política nacional.

Hoje, o foro privilegiado garante que cerca de 55 mil autoridades incluindo parlamentares, ministros de Estado, governadores, desembargadores e membros de tribunais de contas sejam julgadas diretamente por tribunais superiores, como STF e STJ, nos crimes comuns. Com a PEC, esse número cairia drasticamente: apenas os presidentes da República, do Senado, da Câmara e do STF manteriam o foro especial. Todos os demais passariam a responder na primeira instância, como qualquer cidadão.

O contraste no tempo de tramitação é significativo. No STF, ações penais contra autoridades com foro privilegiado levaram em média 1.300 dias (cerca de três anos e meio) para chegar a julgamento, segundo levantamento do próprio tribunal. Na primeira instância, embora haja sobrecarga, a tendência é que casos menos complexos avancem mais rapidamente, sobretudo fora dos grandes centros. Essa diferença é parte do argumento dos defensores da PEC, que enxergam nela uma forma de acelerar a responsabilização.

Até lá, a controversa seguirá sendo escrito longe dos microfones. No jogo político de Brasília, onde cada voto é moeda e cada silêncio pesa mais que um discurso inflamado, o destino da PEC 333/2017 será decidido no subtexto das negociações, não apenas no painel eletrônico da Câmara.

Mais lidas

IgesDF seleciona médicos com salários de a...
Médico do Hospital de Base aplica técnica ...
PEC do fim do foro privilegiado
...