A sessão desta terça (1) da CPI da Covid foi encerrada há pouco em clima quente. Os senadores sabatinaram a médica oncologista e imunologista Nise Yamaguchi ao longo do dia. Aziz disse que a depoente mentiu. Houve contradições e negação sobre suposto decreto sobre cloroquina.
Nesta quarta-feira (2), às 9h30, será a vez da infectologista Luana Araújo, demitida do cargo de secretária extraordinária de Enfrentamento à Covid-19 do Ministério da Saúde 10 dias depois de assumir o posto. Omar Aziz pediu para que quem estivesse ouvindo a fala de Yamaguchi desconsiderasse o que ela havia sustentado sobre a vacina contra Covid-19.
Omar Aziz (PSD-AM), acusou nesta 3ª feira (1º.jun.2021) a médica Nise Yamaguchi de mentir ao colegiado quando ela ratificou falas anteriores em que defendia o tratamento precoce como forma de salvar vidas na pandemia e que, por isso, a vacinação de toda a população não seria necessária. Ele chegou a pedir para que, quem estivesse assistindo à CPI, não ouvisse os dizeres da médica.
“Não escutem o que ela está dizendo. Todos os brasileiros precisam de duas vacinas. […] Quem está nos vendo neste momento não acreditem nela, tem que vacinar. A vacina salva, tratamento precoce não salva”, disse Aziz. O senador disse ainda que a “voz calma da médica convence as pessoas”.
Diversos senadores se manifestaram no mesmo sentido e pediram que a sessão fosse encerrada e que Yamaguchi fosse chamada novamente na condição de convocada. A médica fala à CPI como convidada, em que não era obrigada a comparecer. Na 1ª situação, há um compromisso legal de se dizer a verdade, sob a possibilidade de haver punição em caso de declarações falsas.
A discussão começou após o relator da comissão, Renan Calheiros (MDB-AL), exibir vídeos em que Yamaguchi diz que o “tratamento precoce salva vidas” e que, por isso, não seria “preciso vacinar a população aleatoriamente porque há tratamento precoce para a covid-19”. A médica ratificou sua declaração e tentou explicar que se tratava de duas questões diferentes. “Eu disse que vacina não é tratamento, vacina é prevenção. Uma coisa é uma coisa, outra coisa é outra coisa”.
Nise confirmou hoje aos senadores que sugeriu o ‘tratamento precoce’ durante a gestão de Luiz Henrique Mandetta na Saúde, que teve viagem a Brasília paga pelo Ministério e que participou de “comitê de crise institucional”.
A médica Nise Yamaguchi disse à Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) da Covid, que “desconhece qualquer gabinete paralelo” de aconselhamento ao presidente Jair Bolsonaro sobre pandemia, mas admitiu participar de um “conselho científico independente” com o empresário Carlos Wizard.
“Não participo de nenhum gabinete paralelo”, disse Yamaguchi, apesar de admitir que participou “como convidada” de uma reunião com o comitê de crise interministerial, presidido pelo general Walter Braga Netto. “Sou uma colaboradora eventual”, disse.
A médica afirmou que esteve com o presidente “umas quatro vezes” e que nunca teve encontros privados com Bolsonaro, embora a agenda oficial do presidente informe uma reunião entre ele e Yamaguchi em 15 de maio de 2020.
Consta na mesma agenda pelo menos duas outras reuniões de Bolsonaro com Nise, com a participação de outros integrantes do governo federal, nos dias 6 e 7 de abril de 2020.
Confrontada pelo senador Renan Calheiros (MDB-AL) com o registro de seis datas em que esteve em reuniões com autoridades do governo federal, cinco delas no Palácio do Planalto, Yamaguchi afirmou que precisaria checar com seus assessores. Disse também que apenas uma das passagens à Brasília foi paga pelo governo.
Yamaguchi afirmou que recebeu convites feitos pela secretária do presidente da República e que falou com seus assessores.
Yamaguchi foi questionada pelo senador Randolfe Rodrigues (Rede-AP) sobre uma troca de mensagens com outro médico, o anestesista Luciano Dias, em que fala sobre um decreto para alteração da bula da cloroquina.
Nas mensagens, fornecidas à CPI pela própria Yamaguchi, ela afirmou que a bula de um medicamento não poderia ser alterada desta forma porque isso violaria as normas que regem o tema.
Yamaguchi afirmou então que fazer isso “exporia muito o presidente”. Esclareceu também que recebeu uma cópia do decreto após a reunião interministerial.
A médica disse ainda que não sabe quem elaborou o decreto. Rodrigues defendeu então que Luciano Dias seja convocado para depor na CPI.
A comissão tem investigado quem faz aconselhamento médico e técnico a Bolsonaro sobre a pandemia desde que os ex-ministros da saúde Luiz Henrique Mandetta (DEM-MS) e Nelson Teich afirmaram na CPI que o presidente não se aconselhava com eles.
Outros nomes que fizeram aconselhamento a Bolsonaro também serão convocados na CPI nas próximas sessões. Entre eles o empresário Carlos Wizard e o ex-assessor especial da Presidência Arthur Weintraub.
Nenhum deles ocupou cargo oficial no Ministério da Saúde, mas todos participaram de eventos e reuniões oficiais com Bolsonaro para tratar de assuntos relacionados à pandemia.
Yamaguchi afirmou que conheceu Wizard em uma reunião sobre um “conselho científico independente” para lidar com a questão da pandemia. Disse também que conheceu Weintraub em uma reunião com o presidente da República.
A médica disse também que não conhecia Wizard na época em que Mandetta era ministro, mas admitiu que teve reuniões com o governo nessa época.
Yamaguchi esclareceu que o conselho científico trabalhou fazendo levantamento de dados científicos de forma voluntária e apresentou essas informações ao governo.
A médica disse ainda que chegou a ser cogitado que o grupo fosse um conselho do próprio Ministério da Saúde, mas que depois optou-se por não ter vínculos formais com a pasta.
“A princípio, ele seria do ministério, mas não foi. Foi independente”, disse.
Yamaguchi afirmou ainda se sentir “agredida” ao ser incluída pelo senador Rogério Carvaho (PT-SE) como integrante do suposto gabinete paralelo e reforçou que atuou como “colaboradora eventual”.
A médica foi questionada pelo senador Tasso Jereissati (PSDB-CE) se considera correto ter dado opiniões ao governo que eram contrárias às orientações do ministro na época.
“Eu sustento minhas opiniões científicas. Elas são coerentes e são baseadas em dados. Como cientista tenho que dar minha opinião, que é pública”, afirmou.
Defensora do tratamento precoce com remédios sem comprovação científica, como cloroquina e ivermectina, Yamaguchi foi convidada à CPI depois de seu nome ter sido citado pelo presidente da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), Antônio Barra Torres, em seu depoimento aos senadores.
Barra Torres afirmou que houve uma reunião no Planalto na qual foi discutido alterar por decreto a bula da cloroquina, para que o medicamento passasse a ser indicado contra a covid-19. Yamaguchi estava presente, segundo Barra Torres e Luiz Henrique Mandetta (DEM-MS), ex-ministro da Saúde, que também falou à CPI sobre o encontro.
De acordo com Yamaguchi, o tema da reunião, no dia 20 de abril de 2020, eram “ações da hidroxicloroquina”, mas negou que o encontro tivesse sido convocado para alterar a bula do medicamento.
A bula acabou não sendo alterada, segundo Barra Torres, porque a Anvisa só pode fazê-lo após análise a pedido dos fabricantes dos remédios – o que não aconteceu no caso da cloroquina, já que o remédio não tem eficácia comprovada no combate à covid-19.
Barra Torres afirmou que, após explicar que o procedimento não era possível, o general Braga Netto rasgou o documento que estava em cima da mesa.
Yamaguchi afirmou que não fez nenhuma minuta sobre a mudança da bula e negou que existisse ideia de mudança de bula da cloroquina por minuta ou por decreto.
“Então, o presidente da Anvisa mentiu?”, questionou o senador Renan Calheiros.
“Eu acho que ele deveria pelo menos apresentar a minuta, porque nesse momento não houve minuta de mudança de bula”, afirmou. “Depois eu fiquei sabendo que a minuta não era para isso.”
A médica entrou depois em contradição sobre esse assunto ao confirmar a existência do decreto.