Por Miguel Lucena, advogado e jornalista
Desde os tempos de Molière, o humor tem sido reconhecido como uma poderosa ferramenta contra os abusos de poder. O dramaturgo francês afirmava que não existia tirania capaz de resistir a uma gargalhada, e sua obra permanece como prova de que o riso pode desmascarar vícios humanos e enfraquecer estruturas opressivas. Comédias como O Avarento, O Doente Imaginário e Tartufo expõem a hipocrisia da sociedade e demonstram como a sátira pode provocar reflexão e mudança.
Na contemporaneidade, porém, o humor enfrenta desafios. Vivemos em uma sociedade brutalizada por radicalismos, onde a polarização e as sensibilidades exacerbadas criam um ambiente de constante vigilância. Piadas que antes eram vistas como críticas bem-humoradas hoje podem ser interpretadas como ofensas, o que limita a liberdade criativa e o poder contestador do riso. No entanto, apesar das restrições impostas pelo cenário atual, o humor continua sendo uma importante arma de resistência. Ao expor o ridículo das posturas autoritárias, ele desarma o opressor e fortalece o oprimido, funcionando como uma forma de subversão que desafia o status quo.
Além da crítica social, o humor também exerce uma função catártica. Diante das adversidades da vida, o riso atua como um mecanismo de desabafo pessoal, ajudando as pessoas a enfrentarem situações difíceis com leveza. Uma piada bem colocada tem o poder de transformar o peso do cotidiano em algo suportável, aliviando tensões e proporcionando momentos de alívio em meio ao caos. Essa capacidade de tornar a vida mais suportável é, por si só, uma forma de resistência, pois impede que o desespero tome conta do indivíduo.
Mesmo em tempos de censura velada e patrulhamento ideológico, o humor persiste como um espaço de liberdade. Ele continua a florescer em períodos de crise, provando que, por mais rígida que seja a tirania, ela jamais será capaz de silenciar uma gargalhada. Afinal, enquanto houver alguém disposto a rir do poder, haverá esperança de transformá-lo.