Fragilidades na delação premiada e falta de materialidade comprometem acusação por tentativa de golpe
Por Carlos Arouck
O depoimento do tenente-coronel Mauro Cid ao Supremo Tribunal Federal (STF), em 9 de junho de 2025, trouxe elementos que enfraquecem a narrativa da Procuradoria-Geral da República (PGR) sobre uma suposta tentativa de golpe de Estado atribuída ao ex-presidente Jair Bolsonaro.
Cid, ex-ajudante de ordens de Bolsonaro, apresentou respostas evasivas, como “não sei” e “não lembro”, que comprometem a credibilidade de sua delação premiada. As contradições em suas falas, especialmente sobre o suposto pedido de “apoio logístico” para a operação “Copa 22”, revelam fragilidades na acusação. Ele mudou sua versão, sugerindo que a solicitação poderia estar relacionada à sua transferência para o 1º Batalhão de Ações e Comandos, em Goiânia, e não a uma articulação golpista.
Segundo a denúncia da PGR, a tentativa de golpe estaria ancorada em uma minuta de decreto para instaurar Estado de Sítio ou Estado de Defesa, com o objetivo de reverter o resultado das eleições de 2022. Cid, porém, afirmou que o documento nunca foi assinado e que sua elaboração estava condicionada à comprovação de fraude eleitoral algo que, segundo ele, nunca foi identificado. Ele ainda reforçou que suas mensagens indicavam ausência de provas concretas, limitando as discussões ao “campo da estatística”.
Essa contextualização enfraquece a tese de que a minuta seria um ato preparatório de golpe, sugerindo, em vez disso, que se tratava de uma medida contingencial para uma hipótese que não se concretizou. Cid também negou qualquer conhecimento ou envolvimento de Bolsonaro nos atos de 8 de janeiro de 2023, que culminaram na invasão dos Três Poderes.
Questionado pela defesa, afirmou nunca ter ouvido o ex-presidente mencionar informações prévias ou incitar as manifestações. Um áudio reproduzido durante o depoimento mostrou Bolsonaro rejeitando pressões para ações extremas, como o uso do artigo 142 da Constituição, e dizendo que o governo Lula “cairia de podre” sem necessidade de intervenção.
Essas declarações reforçam a tese de que Bolsonaro evitou ações fora da legalidade, mantendo-se dentro dos limites constitucionais.
Outro ponto levantado pela PGR, o suposto “plano de contingenciamento e fuga” de março de 2021, também foi recontextualizado por Cid. Ele explicou que o plano visava proteger Bolsonaro em caso de um golpe contra ele, e não organizar uma ação golpista. Segundo Cid, o ex-presidente sequer tinha conhecimento do plano. Essa versão contradiz diretamente a narrativa acusatória, que via o plano como parte de uma conspiração contra o Estado Democrático de Direito.
A condução do interrogatório pelo ministro Alexandre de Moraes também gerou controvérsia. Relatos indicam que Moraes, incomodado com as contradições de Cid, interveio para “explicar” perguntas, o que pode ser interpretado como tentativa de direcionamento. Cid ainda admitiu que a Polícia Federal demonstrou “frustração” quando suas declarações não coincidiam com a linha da investigação, reacendendo suspeitas de pressão — embora ele tenha negado qualquer coação explícita.
Em resumo, o depoimento de Mauro Cid expõe a fragilidade das provas contra Bolsonaro. A ausência de elementos concretos que o liguem a atos golpistas, somada às contradições do coronel delator e à possível interferência externa no interrogatório, fortalece a defesa. A PGR, por sua vez, enfrenta o desafio de sustentar uma acusação que, até aqui, parece mais especulativa do que fundamentada.