Por Carlos Arouck
O “inimigo imaginário” pode estar menos em Washington e mais em Brasília: na incapacidade de conduzir uma política fiscal sólida, fortalecer instituições e gerar confiança no futuro econômico do país.
Em 2025, o Brasil atravessa uma tempestade econômica e diplomática que mistura juros recordes, inflação acima da meta e uma crise comercial com os Estados Unidos. No centro da narrativa, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva insiste que há uma conspiração externa contra o país. Para especialistas, porém, o problema é mais doméstico: falta de disciplina fiscal e uma condução errática da política econômica.
Uma decisão recente do ministro Flávio Dino, do Supremo Tribunal Federal (STF), determinou que instituições financeiras brasileiras não devem cumprir ordens de bloqueio emitidas por Estados estrangeiros. Embora o caso pareça desconexo, a medida é interpretada como reação às sanções impostas pelos EUA contra o ministro Alexandre de Moraes. A tentativa de blindar Moraes, no entanto, pode ter efeito colateral grave: o Brasil corre risco de exclusão financeira global. Descumprir sanções internacionais pode restringir o acesso ao sistema bancário internacional, afetar operações de crédito e corroer a credibilidade do país no mercado.
No dia 15 de julho de 2025, o Escritório do Representante Comercial dos Estados Unidos (USTR) abriu investigação contra o Brasil com base na Section 301 do Trade Act de 1974, instrumento usado historicamente por Washington para retaliar práticas comerciais consideradas desleais. O inquérito mira setores como comércio digital e serviços de pagamento eletrônico, tarifas preferenciais, proteção à propriedade intelectual, mercado de etanol, combate à corrupção e desmatamento ilegal. Se confirmadas as acusações, os EUA podem impor tarifas adicionais de até 50% sobre produtos brasileiros, além de barreiras não tarifárias e restrições a benefícios comerciais. O impacto seria devastador: perda de competitividade do agronegócio, sanções ao comércio digital, bloqueio de empresas de tecnologia e questionamentos sobre governança e transparência.
Um dos pontos centrais da investigação é a percepção de que o Brasil falhou no combate à corrupção. A Operação Lava Jato ainda repercute internacionalmente, e empresas brasileiras continuam enfrentando barreiras de credibilidade no exterior. Para Washington, a reincidência de práticas ilícitas e a interferência política em órgãos de controle reforçam a ideia de que o país não implementou reformas estruturais após os escândalos. A decisão do ministro Dias Toffoli, que encerrou de vez os efeitos da Lava Jato, fortaleceu essa percepção. O governo dos EUA, sob ordem de Donald Trump, já admite sanções mais pesadas: bloqueio de ativos, tarifas de até 100% e punições a políticos e magistrados brasileiros. A mensagem é direta: se o Brasil não pune corruptos, será tratado como cúmplice.
Enquanto o front diplomático se complica, a economia doméstica mostra sinais alarmantes. A dívida pública deve alcançar entre R$ 8,1 e R$ 8,5 trilhões em 2025, o equivalente a cerca de 92% do PIB, segundo o FMI. A taxa Selic está em 15% ao ano, uma das mais altas do mundo em termos reais, o que encarece o crédito e aumenta o custo da dívida pública. A inflação, projetada em 4,95%, supera o teto da meta de 4,5% e corrói o poder de compra. O dólar, que fechou 2024 a R$ 6,18, segue volátil em meio a incertezas fiscais e pressões externas.
Em discursos recentes, Lula tem responsabilizado fatores externos pela turbulência, acusando os EUA de protegerem empresas americanas e de usar a Section 301 como instrumento de retaliação política. Críticos, no entanto, veem nessa retórica apenas um esforço para transferir responsabilidades. A estratégia pode até mobilizar apoio interno, mas aprofunda a desconfiança de investidores e aumenta o risco de isolamento do Brasil em negociações comerciais. Se as sanções se confirmarem, o impacto será direto: bilhões em perdas para o agronegócio, que responde por mais de 25% do PIB, além de prejuízos para empresas de tecnologia e meios de pagamento. Mesmo que o Brasil recorra à OMC, o processo levaria anos e os EUA têm histórico de ignorar decisões da entidade.
Lula tenta enquadrar os EUA como vilão de um complô contra o Brasil, mas especialistas apontam que a crise nasce dentro de casa: dívida crescente, juros elevados, inflação persistente e instituições enfraquecidas. O Bureau of Western Hemisphere Affairs foi explícito em comunicado: “Alexandre de Moraes é tóxico para todas as empresas legítimas e indivíduos que buscam acesso aos Estados Unidos e seus mercados”. O recado é inequívoco: nenhum tribunal brasileiro tem poder de anular sanções impostas por Washington até cidadãos estrangeiros podem ser punidos se derem apoio a pessoas listadas como violadoras de direitos humanos.