Por Maria José Rocha Lima
Pai, nestes dias, pensando em você, lembrei-me da infância no Bairro do Bonfim. Veio à minha memória um dos dias mais felizes da minha vida: aquele em que você foi nos visitar e, não nos encontrando, deixou um presente na casa da vizinha. Era uma malinha escolar de couro, vermelha, toda pespontada de branco. Dentro, era forrada com um papel cuja padronagem, de tão linda, já era por si só um novo presente.
A mala tinha um cheiro delicioso de coisa nova, igual à sensação inédita de possuir algo tão especial. Na minha afobação de abri-la, conhecê-la e possuí-la, não percebi, de imediato, o que ela guardava. Veio então a segunda grande emoção: descobrir, como nos contos de tesouros encantados, uma bela caixa de lápis de cor, uma régua, compasso, esquadro, caderno de desenho, borracha, lapiseira (como chamávamos o apontador) e lápis grafite.
A caixa de lápis de cor era linda, de flandres, decorada com pinturas silvestres: folhagens, passarinhos e araras coloridas, todos belíssimos. Os lápis, de excelente qualidade, exalavam o perfume da madeira de lei misturado a um cheiro bom de tinta — aroma que até dava pena gastar.
Percorri a avenida de casas tentando alcançá-lo para agradecer, mas o senhor seguia sempre apressado… Tantos anos depois, posso encontrá-lo facilmente na minha memória, certa de que tudo o que sou foi, em parte, construído com as ferramentas contidas naquela malinha mágica que você me ofereceu.
Obrigada, pai!
Da sua filha,
Maria.