Por Carlos Arouck
“Usar a designação juiz de garantia para fazer guerra política a favor ou contra não é papel de estudioso do Direito.”
Dr Ailton Benedito Procurador da República
Logo depois do episódio conhecido como “Intercept” sobre conversas trocadas por membros da força-tarefa e Sérgio Moro, defendi que poderia ser útil a criação da figura do “juiz de instrução” ou “juiz das garantias” no Brasil. Agora o tema volta à tona, resultado da opção de Bolsonaro de não vetar o artigo do pacote anti crime que cria a figura do juiz de garantias.
A iniciativa do presidente pode ser fruto dos debates sobre limites éticos jurídicos e, consequentemente, sobre a estrutura de apoio de uma operação de porte como a Lava Jato, como forma de se evitar especulações sobre a lisura do processo. Assim, Bolsonaro sancionou a lei 13.964/19, que traz novidades para a legislação em vigor, sendo a mais discutida a criação do juiz de garantias.
O “juiz de instrução” ou “juiz das garantias” atua apenas na fase inicial das investigações, autorizando ou impedindo ações como quebra de sigilo e interceptações telefônicas, depoimentos e prisões preventivas.
Esse juiz existe em outros países. Para citar um exemplo, no sistema francês, a pesquisa da verdade sobre a infração cabe ao juiz de instrução, que tem a dupla função de investigador e de juiz. A polícia age sob a autoridade do juiz. O MP toma apenas uma parte dessa investigação com papel reduzido.
Nos EUA, o papel dos juízes de instrução na investigação de crimes é limitado. Chamado de “examining magistrate” ou “investigating magistrate” ou “investigating judge”, é um juiz que realiza investigação. Os deveres e poderes comuns do juiz de instrução incluem supervisionar as investigações criminais em andamento, emitir mandados de busca, autorizar escutas telefônicas, tomar decisões sobre detenção preventiva, interrogar a pessoa acusada, interrogar testemunhas, examinar evidências e compilar um dossiê de evidências em preparação para o julgamento.
O Procurador da República Dr. Airton Benedito esclareceu em seu Twitter dúvidas sobre a lei que institui o “juiz de garantias” e altera diversas normas. Segundo ele, não é possível sua implementação imediata, uma vez que o prazo de apenas um mês é insuficiente para alterar todas as leis de organização judiciária dos Estados, Distrito Federal e da União, ainda mais em pleno período de recesso legislativo, sob pena de nulidade das investigações sem “juiz de garantias”.
Vale, ainda, lembrar que a alteração da lei de organização judiciária dos Estados para estabelecer a competência do “juiz de garantias” é de iniciativa do respectivo Tribunal de Justiça, a ser aprovada pela Assembleia Legislativa e sancionada pelo governador.
Devido à dificuldade de cumprir o prazo determinado pela lei de 1 mês para implementar as mudanças, como o juiz de garantias, é juridicamente possível que o presidente da República opte por editar uma Medida Provisória alterando a “vacatio legis” dos 30 dias previstos para 1 ano ou mais. Ou seja, como há urgência e relevância que justifiquem a edição de Medida Provisória, os Poderes Executivo, Legislativo, Judiciário, e o Ministério Público terão, consequentemente, mais tempo para as correções necessárias, evitando prejuízos para o combate ao crime no Brasil disse ainda o procurador da república
Mesmo com mais tempo, a realidade é que o Brasil tem vagas de juízes não providas e uma média relativamente baixa de juiz por cidadãos. O volume de processos é grande e a espera por um resultado também.
“Conclusão, até agora: bem ou mal, significa uma revolução na persecução criminal no Brasil. O diabo mora nos detalhes”, citando novamente Dr Ailton Benedito, Procurador da República.
* Policial federal, Carlos Arouck é formado em Direito e Administração de Empresas, instrutor de cursos na área de proteção, defesa e vigilância, consultor de cenários
políticos e de segurança pública, membro ativo de grupos ligados aos movimentos de rua.