Por Miguel Lucena
Fui a Biocárdios, em Brasília, fazer um exame do coração. Cheguei cedo, de estômago vazio e esperança cheia — esperança de que ainda houvesse algum músculo cardíaco intacto. A moça da recepção me entregou um formulário com perguntas variadas: nome, idade, se sou hipertenso, se já vi Jesus em forma de luz, essas coisas.
Lá pelo meio, uma pergunta me fez coçar a caneta: “Está grávido(a)?”. Confesso que hesitei. A barriga, fruto de uma convivência afetiva com cuscuz, pão de queijo e outros amores não correspondidos, parecia de três meses, talvez até quatro. Deu vontade de escrever: Sim, gestante emocional, esperando um menino chamado Colesterol Júnior.
Mas resisti. Vai que o cardiologista levasse a sério e me mandasse pra maternidade em vez da esteira. Continuei preenchendo o questionário com dignidade, embora sem conseguir esquecer a pergunta. A medicina avançou tanto que talvez eu realmente esteja grávido de um susto, de um infarto adiado ou de uma saudade presa no átrio esquerdo.
No fim, fui chamado pelo nome, entre um senhor que dizia ter o coração em ordem e uma senhora que já havia enviuvado de três infartos alheios. Entrei para fazer o exame. O coração batia normal, embora com um certo ritmo de forró pé de serra.
A conclusão? Ainda não pari, mas sigo gestando alguma emoção antiga. E a barriga… bem, essa continua crescendo, firme, cheia de afeto e pão francês.