Por Pedro Durán
“É um desastre, o governo é um verdadeiro desastre”, diz um vice.
“Houve uma incompatibilidade de interpretação e da maneira, cada um tem a sua”, diz outro.
“E o pior de tudo é que pra tentar se reeleger, que é uma aventura que não vai ter sucesso, ela tá dilapidando o resto dos recursos públicos e empregando um monte de gente que não consegue nem pagar os seus próprios empregados, então é uma coisa completamente maluca”, completa o terceiro.
Pode parecer intriga da oposição, mas esses vice-governadores estão falando daqueles com quem dividiram o palanque há menos de quatro anos. E ao lado deles, foram eleitos.
A briga entre governantes e vices sempre marcou a política brasileira, mas nesse 2018 de acirramento político se tornou marca na gestão de cinco estados brasileiros.
No final de janeiro, um fato curioso atraiu os olhares para Roraima. Depois da renúncia do vice-governador Paulo César Quartiero, o governo do estado alegou que encontrou um cheque de 500 mil reais assinado presidente da Assembléia Legislativa do Estado no gabinete onde Quartiero trabalhava.
Depois da revelação, Quartiero foi para Belém do Pará trabalhar na plantação de arroz comandada pelos filhos. Em entrevista à CBN ele rompeu o silêncio, rebateu a acusação do cheque e disse que a governadora Suely Campos, do PP, cometeu “estelionato eleitoral”.
“Atingimos já o fundo do poço, não é possível que agora nós vamos ficar cavando pra afundar mais. Eu tenho convicto que a solução passa pelo afastamento desse governo. Agora entraram com essa história aí do cheque, que eu acho que o espírito do [presidente Nicolás] Maduro, que nós somos vizinhos da Venezuela, contaminou o nosso governo.O cheque é um cheque que só poderia ser cobrado no banco da lavoura do Afeganistão. O cheque de 2013, rasurado, de uma conta que não existe mais e de um banco que nem mais a agência é naquele local. É uma coisa simplesmente ridícula, né?, diz Quartiero.
Em nota, a governadora Suely Campos alega que o governo de Roraima disse que foi até a sede da vice-govenadoria apenas para fazer um levantamento do patrimônio e quando descobriu indícios de crime, a Polícia Civíl decidiu lacrar o local. A investigação continua em curso.
Na Paraíba, o clima de desconfiança paira no Palácio da Redenção. O governador Ricardo Coutinho, do PSB, está cada vez mais longe da vice, Lígia Feliciano, que é do PDT. Nos bastidores, pessoas ligadas a Coutinho dizem que ele quer manter o estado nas mãos do PSB, mas Ligia tem pretensões de assumir o cargo.
No Distrito Federal, o governador Rodrigo Rollemberg e o vice Renato Santana seguem caminhos opostos desde o começo da gestão. Tudo se agravou há pouco mais de um ano, quando Santana, que é do PSD, foi exonerado da administração regional de Vicente Pires. Com uma estrutura de 33 servidores, ele tem usado a equipe para fazer uma espécie de ouvidoria do mandato. Nas eleições deste ano, Santana deve apoiar o deputado Rogério Rosso na oposição a Rollemberg, que está trazendo o PSDB para perto do partido dele, o PSB.
“Uma coisa é certa: dificilmente o Renato Santana e o Rodrigo Rollemberg, governador, seguirão numa mesma embarcação. Por tudo que aconteceu ao longo desse ano. Qual caminho ele vai seguir, se tem indíces de aprovação ou não, eu acho que essa é uma decisão dele, é uma avaliação dele. Se você me perguntar se vou ser candidato, ‘ao que Deus quiser, ao que Deus quiser’”, diz Santana.
No Rio Grande do Norte, o partido do vice-governador Fábio Dantas, rompeu com a gestão de Robinson Faria no fim do ano passado. Antes disso, o político do PSD já tinha desautorizado decisões do vice depois de duas viagens internacionais que ele fez. O desembarque do PC do B isolou o vice e a mulher, que é deputada no estado, mas pode ser o prenúncio de caminhos opostos.
No Pará, o vice-governador Zequinha Marinho se lançou como candidato ao senado, irritando pessoas ligadas ao governador tucano Simão Jatene, que em vez do vice preferiu apoiar o deputado democrata Márcio Miranda para sucedê-lo.
Em Minas, a aliança PT-MDB ruiu de vez em 2016, quando o vice Toninho Andrade apoiou um tucano no segundo turno das eleições da capital, em 2016. Ele classifica o governo de Fernando Pimentel como um desastre e, embora não defenda o impeachment, diz que o petista não tem o que mostrar pra tentar uma reeleição. Como o MDB é o partido que tem mais prefeituras mineiras nas mãos, ele defende que o deputado Rodrigo Pacheco, presidente da CCJ da Câmara, suceda Pimentel.
“Eles me afastaram do governo, eles começaram a demitir pessoas minhas. Houve um acordo do governador com o presidente da Assembleia e o secretário de Saúde pra me afastar do governo. [O senhor acha que foi um complô contra o senhor?] Exatamente, exatamente. [Qual foi a última vez que o senhor falou com o Pimentel?] Um mês atrás acho que eu falei com ele pelo telefone. [O senhor está há um mês sem falar com o governador?] Exatamente. Ele não me procura e eu não quero perturbar o governador. Eu vou deixar passar o governo e vou trabalhar pelo PMDB, pela candidatura própria, pra suceder esse desastre que tá aí”, diz Andrade.
Pimentel não quis comentar as declarações do vice.
Em outros estados, sinal amarelo na relação. É o caso da Bahia, onde até há uma boa relação entre governador e vice, mas uma possível candidatura do prefeito de Salvador, ACM Neto, ao governo pode romper a aliança entre o PT e PP e separar o governador Rui Costa do vice João Leão. Os dois partidos também podem se afastar na tentativa de reeleição do Piauí.
Em São Paulo, Alckmin não decidiu ainda pra quem passará o bastão. Com alianças em 9 a cada 10 prefeituras do estado, a voz dele é decisiva. O tucano deve sair à presidência. Enquanto isso, o vice, Márcio França, do PSB, já está amarrado a outros três partidos para a campanha ao governo. Se Alckmin escolher outro sucessor, pode ter problemas com aliados que ocupam postos importantes no estado.
No Paraná, a vice Cida Borgheti, do PP, conta os dias pra ter a caneta do governo nas mãos, mesmo com a resistência do tucano Beto Richa de deixar o cargo. Se o governador apoiar Ratinho Junior, ex-secretário e filho do apresentador de TV para a sucessão, a relação entre ele e a mulher do ministro da saúde pode azedar.
*Colaboraram Laura Tizzo, Basília Rodrigues e Lilavati Oliveira