Francisco Dutra
Falta carne vermelha nas refeições de escolas públicas do Distrito Federal. O feijão não é visto nos pratos dos alunos e alunas do meio período. Virou, praticamente, um luxo das unidades integrais. Por outro lado, é servido um número desproporcional de pratos de um peixe fluvial com alto teor de gordura, o Mapará. O pescado tem o gosto e o odor reprovados por grande parte dos estudantes. No mesmo descompasso, o ovo ganhou um protagonismo intrigante na dieta pública escolar.
O diagnóstico foi traçado pelo Sindicato dos Professores do DF (Sinpro/DF). Segundo a instituição, diante destes fatos o desmaio por fome de um aluno na Escola Classe do Cruzeiro não é um episódio pontual, mas uma sintoma das falhas de gestão e planejamento do governo na alimentação de crianças e adolescentes. “Carne não é servida há muito tempo em várias escolas integrais e de horários parciais. Cobramos lanche de qualidade para as crianças”, afirma o diretor do Sinpro, Samuel Fernandes.
Até o começo deste ano, a carne oferecida na rede pública vinha de um contrato com a empresa JBS, alvo da operação Carne Fraca e conduzida por empresários acusados por pagar propina para centenas de políticos na operação Lava Jato. O nome do governador Rodrigo Rollemberg (PSB) está na lista de governadores da JBS, apreendida nas investigações. O contrato da JBS com o GDF terminaria em meados de 2017.
Na repentina ausência de carne, o Mapará nada de braçada. O governo reservou R$ 17.287.409,00 para a aquisição do peixe de água doce. O contrato com a empresa Litoral Pescado foi assinado pelo próprio secretário de Educação, Júlio Gregório, em 1 de setembro deste ano, com validade até 31 de agosto de 2018.
A soma do Mapará chama atenção, por ser muito maior do que a compra de outros pescados. Por exemplo, o contrato com a empresa Comercial Milano para filé de Merluza é de R$ 2.116.900,80, indo de março deste ano até março de 2017. Por outro lado o festival de ovos nasce de um contrato de R$ 2.530.837,20. O documento também é firmado por Júlio Gregório.
Nutricionistas criticam organização
Desde de 2007, o Conselho Regional de Nutricionistas da 1ª Região, responsável pelo DF, denuncia falhas no planejamento e gestão da merenda pública. Segundo a nutricionista gerente técnica da instituição, Janaína Marques Baiocchi, o desmaio do estudante é apenas a ponta do iceberg de problemas estruturais na alimentação escolar.
Na análise da especialista, existem falhas na aquisição centralizada de gêneros, na distribuição da comida, na disponibilidade de veículos para a atuação dos nutricionistas nas escolas e na estrutura para armazenar e processar adequadamente os alimentos.
“O cardápio planejado, pela secretaria de Educação, nem sempre é executado pelas regionais de ensino. Isso ocorre na maioria das vezes”, conta a nutricionista. Neste contexto, a compra centralizada é o ponto de ignição para as falhas.
Na sequência, a licitação para distribuição de alimentos apresenta apenas 15 caminhões para atender 673 escolas públicas. Poucos veículos dificultam o transporte adequado de gêneros, no tempo necessário para evitar a perda de validade.
“Falta carro para a fiscalização e orientação de nutricionistas nas escolas”, argumenta. Janaína conta que o GDF até hoje não apresentou para o Conselho resultados de teste de aceitação dos alimentos, recomendados pelo Programa Nacional de Alimentação Escolar (PNAE).
O procedimento evitaria polêmicas como no caso da inclusão em escala crescente do Mapará no cardápio brasiliense.