Câmara dribla STF e incha número de deputados

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Câmara amplia número de deputados e ignora redistribuição prevista pelo Censo de 2022

 

 

A Câmara dos Deputados aprovou, nesta terça-feira (6), um projeto de lei complementar que aumenta de 513 para 531 o número de cadeiras na Casa a partir de 2027. A medida, proposta como resposta à determinação do Supremo Tribunal Federal (STF) para adequação da representação proporcional ao Censo de 2022, acaba por ignorar o objetivo central da decisão judicial: redistribuir as vagas com base na atual realidade populacional. A proposta segue agora para o Senado.

O texto aprovado — um substitutivo do relator Damião Feliciano (União-PB) ao PLP 177/23, de autoria da deputada Dani Cunha (União-RJ) — manteve o número de representantes nos estados que perderiam cadeiras segundo os dados censitários. Em vez de corrigir distorções, criou 18 novas vagas e evitou desagradar bancadas influentes. A justificativa do relator é política: “Estamos a falar de um acréscimo modesto de 3,5%, enquanto a população nos últimos 40 anos cresceu mais de 40%”.

O impacto orçamentário estimado é de R$ 64,8 milhões por ano, valor que não inclui os recursos adicionais destinados a emendas parlamentares, uma das principais moedas de troca política no Congresso. Para a próxima legislatura, que começa em 2027, o acréscimo será absorvido pelas previsões orçamentárias, mas sem debate mais amplo sobre gastos públicos e representatividade.

A decisão da Câmara ocorre após o STF ter fixado prazo até 30 de junho deste ano para o Congresso redefinir a composição da Casa, sob pena de o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) fazê-lo. A Corte acatou ação do governo do Pará, que denunciava omissão legislativa. Com base na Lei Complementar 78/93, o STF previa redistribuição sem aumento do total de vagas, limitando-se ao realinhamento proporcional. O novo projeto revoga essa lei e desvia do caminho jurídico traçado.

Sete estados seriam penalizados com perda de cadeiras segundo o Censo: Rio de Janeiro (-4), Paraíba (-2), Bahia (-2), Piauí (-2), Rio Grande do Sul (-2), Pernambuco (-1) e Alagoas (-1). Com o aumento do número total de cadeiras, esses estados foram preservados — uma clara manobra para evitar desgaste político.

Por outro lado, 12 estados serão beneficiados com novas cadeiras, entre eles Pará e Santa Catarina, que ganharão quatro cada um, além de Amazonas, Ceará, Goiás, Minas Gerais, Mato Grosso, Rio Grande do Norte e Paraná. Para justificar o aumento da bancada do Paraná de 30 para 31, o relator citou o risco de o estado ter menos representantes que o Rio Grande do Sul, embora tenha população superior.

A medida também impacta as assembleias legislativas estaduais, uma vez que o número de deputados estaduais segue o tamanho das bancadas federais. Assim, unidades da federação que ganham mais deputados federais ampliarão automaticamente suas casas legislativas.

Apesar de corrigir distorções gritantes, como a sub-representação do Norte, o projeto gera novas desigualdades. Estados como o Rio de Janeiro seguem super-representados em relação à sua população atual. E, embora a bancada do Norte passe de 65 para 71 deputados, o crescimento proporcional ainda é insuficiente frente à evolução populacional da região.

O debate em Plenário foi marcado por embates entre governistas e oposição. Para deputados favoráveis, a medida impede interferência do TSE e responde ao crescimento populacional. Para os críticos, trata-se de um arranjo para preservar privilégios e evitar a redução de bancadas decadentes. “É uma acomodação de interesses que aumenta a distorção que a Constituição manda corrigir”, criticou o deputado Kim Kataguiri (União-SP).

Carlos Jordy (PL-RJ) ironizou a ampliação como uma tentativa de garantir a reeleição de parlamentares, enquanto a líder da Minoria, Caroline de Toni (PL-SC), destacou que manter estados com população decrescente com o mesmo número de representantes fere o princípio constitucional da proporcionalidade.

A proposta ainda prevê que os dados do Censo só poderão ser contestados junto ao Tribunal de Contas da União (TCU), sem possibilidade de uso de estimativas ou projeções demográficas. Mesmo assim, não há previsão de nova redistribuição até o próximo Censo oficial — previsto apenas para 2030 ou, no máximo, 2032. Com isso, a atual composição permanecerá congelada por quase uma década.

Em essência, o texto aprovado representa uma solução política que posterga o enfrentamento de um problema estrutural: a desigualdade na representação parlamentar. Ao evitar perdas de poder regional, o Congresso opta por inflar ainda mais sua estrutura e reforçar distorções que o próprio STF tentou corrigir. Resta ao Senado decidir se endossa o movimento de ampliação da máquina pública ou se retoma o caminho da proporcionalidade e da responsabilidade institucional.

Com informações Agência Câmara Federal

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