Por Miguel Lucena
Quando eu era pequeno, achava que a fumacinha que saía da chaminé do Vaticano era obra direta do Espírito Santo, soprando no ouvido do escolhido: “És tu, meu filho”.
Para mim, a fumaça branca era o próprio hálito de Deus anunciando o novo papa. Com o tempo — e a perda da inocência — descobri que a escolha envolve mais de cem cardeais, muitas conversas de bastidor, conchavos discretos e até estratégias geopolíticas. É quase uma eleição parlamentar, com togas vermelhas no lugar de gravatas.
A fumaça continua lá, claro, mas hoje sei que é mais resultado de papel queimado que de inspiração divina. Ainda assim, torço para que, entre os acordos, reste um fiapo de fé — e que o eleito, mesmo saído de um jogo de forças, ainda ouça o sussurro de Deus em meio à fumaça.