PEC do fim do foro privilegiado

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Com o foro, o STF concentra nas próprias mãos o destino de parlamentares

 

Por Carlos Arouck

Oito anos depois de aprovada no Senado, a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 333/2017 que extingue o foro privilegiado para crimes comuns, voltou ao radar legislativo. Não por acaso o seu reaparecimento em 2025 coincide com um momento de choque institucional, no qual decisões do Supremo Tribunal Federal (STF) têm provocado reposicionamentos dentro do Congresso.

A trajetória dessa PEC é marcada por idas e vindas. Em 2013, Alvaro Dias apresentou a proposta para restringir o foro privilegiado, permitindo que apenas os presidentes dos Três Poderes mantivessem esse direito. Quatro anos depois, em 31 de maio de 2017, o Senado aprovou o texto por unanimidade. Desde então, a proposta ficou engavetada na Câmara, travada pela falta de consenso e por manobras discretas para evitar sua votação.

O cenário mudou em fevereiro de 2025, quando a prisão domiciliar de Jair Bolsonaro reacendeu o debate. A oposição, especialmente o PL e parte do Centrão incluindo PP, União Brasil e PSD, viu na PEC uma bandeira política de alto valor. Mesmo sem efeito retroativo, a medida passou a ser tratada como recado ao STF e como instrumento de mobilização de base. Entre março e agosto, líderes partidários iniciaram uma série de reuniões fechadas para garantir os 308 votos necessários à aprovação em dois turnos na Câmara.

Em público, o argumento central é o de que a PEC promove “igualdade perante a lei” e assegura que autoridades sejam julgadas como qualquer cidadão, com direito ao duplo grau de jurisdição. Nos bastidores, porém, os partidos querem reduzir a concentração de julgamentos no STF e, ao mesmo tempo, abrir alternativas jurídicas para aliados sob investigação.

O retorno da proposta não se deu em sessões abertas, mas em articulações discretas. Deputados e senadores alinhados ao Centrão e ao PL têm se encontrado em gabinetes e jantares políticos para articular a votação. A estratégia é evitar exposição precoce, impedindo que adversários proponham emendas capazes de inviabilizar o texto. Paralelamente, aliados da PEC vêm buscando o apoio de governadores e líderes partidários estaduais para orientar suas bancadas a votar a favor.

A oposição à PEC também atua longe dos holofotes. Integrantes do governo Lula evitam confronto direto, mas trabalham para esfriar o ímpeto da votação. O discurso oficial aponta “vícios de inconstitucionalidade” e risco de sobrecarga na primeira instância. Na prática, a preocupação é perder um instrumento de influência política que o foro privilegiado ainda representa em casos estratégicos.

No STF, ministros alertam, em conversas privadas, que o fim abrupto do foro pode gerar insegurança processual, transferir investigações complexas para juízes com pouca estrutura e abrir brechas para recursos que anulem processos.

Um ponto sensível é a ausência de retroatividade: casos já no STF continuarão tramitando ali, mas processos contra autoridades eleitas a partir de 2026 passariam a começar na primeira instância, onde o ritmo e o contexto político são diferentes.

A votação da PEC será mais que um debate sobre privilégios processuais: é uma disputa direta por influência entre Congresso e STF e um teste para medir até onde o Legislativo está disposto a retomar protagonismo no desenho institucional brasileiro.

Se aprovada, a PEC reduzirá o número de autoridades que chegam direto aos tribunais superiores, redistribuindo processos para instâncias inferiores. Isso pode significar um avanço simbólico contra privilégios, mas também alterar o equilíbrio entre os Poderes, mexendo numa engrenagem sensível da política nacional.

Hoje, o foro privilegiado garante que cerca de 55 mil autoridades incluindo parlamentares, ministros de Estado, governadores, desembargadores e membros de tribunais de contas sejam julgadas diretamente por tribunais superiores, como STF e STJ, nos crimes comuns. Com a PEC, esse número cairia drasticamente: apenas os presidentes da República, do Senado, da Câmara e do STF manteriam o foro especial. Todos os demais passariam a responder na primeira instância, como qualquer cidadão.

O contraste no tempo de tramitação é significativo. No STF, ações penais contra autoridades com foro privilegiado levaram em média 1.300 dias (cerca de três anos e meio) para chegar a julgamento, segundo levantamento do próprio tribunal. Na primeira instância, embora haja sobrecarga, a tendência é que casos menos complexos avancem mais rapidamente, sobretudo fora dos grandes centros. Essa diferença é parte do argumento dos defensores da PEC, que enxergam nela uma forma de acelerar a responsabilização.

Até lá, a controversa seguirá sendo escrito longe dos microfones. No jogo político de Brasília, onde cada voto é moeda e cada silêncio pesa mais que um discurso inflamado, o destino da PEC 333/2017 será decidido no subtexto das negociações, não apenas no painel eletrônico da Câmara.

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